Poderia escrever sobre alguma rua do bairro em que moro atualmente. Resolvi não fazê-lo pois não seria algo natural, pois ainda não me apeguei a ela. Ou poderia escrever sobre a rua em que nasci. Poderia sim (confesso que houve tentativas), mas também não fluiria tão bem quanto escrever sobre uma rua especial, que moldou minha atitude.
Nunca morei na Rua Augusta. E confesso que minhas tentativas de escrever sobre outra rua foram iniciadas sob o pretexto de fugir dos padrões e estereótipos já paradigmáticos a esta via de extrema importância para outra a cultura paulistana.
Foi lá onde a minha vida começou a ter uma direção. Desde os 16 anos, a maior parte das minhas lembranças, boas ou ruins, estão na Augusta.
Este logradouro famoso na Paulicéia é transpassado por várias ruas e alamedas ao longo de seu caminho, mas é a Avenida Paulista, o cartão postal da metrópole, o divisor dos “mundos” que fazem a fama da rua. Os dois cenários provenientes dessa cisão possuem belezas opostas na mesma rua, assim como faz o famoso rio Danúbio, onde linda cidade húngara de Budapeste espelha suas paisagens às margens do Rio.
Entretanto, é na direção oposta, ao atravessar a avenida e descer sentido Centro que me sinto completamente em casa. O rádio instalado em minha cabeça, que toca a trilha sonora da minha vida, dispara no último volume e Greg Graffin² grita o que devo fazer: "
Sim, uso minha mente. Ela fervilha. Ao caminhar, vou observando o grande encontro do underground, do baixo clero da sociedade, proveniente de todos os cantos do mundo. Todo o tipo de gente se agrupa em tribos, aldeias, grupos, gangues. Não sei exatamente como me referir, apenas observo cada indivíduo procurando semelhante.
A Augusta permite isso. A diversidade está lá, em todos os aspectos. Os “outsiders” se tornam “insiders”, passam a ter papel importante.
Sempre acompanhado com a melhor amiga do homem – cerveja, para os leigos – vou seguindo, passando por lojas de músicas, restaurantes e cinemas até chegar ao primeiro ponto, o Charm. Advogados, estudantes, engraxates, jornalistas e outros dialogam sobre questões envolvendo física quântica e idade média.
Depois de duas cervejas, vou ao bar seguinte, Ibotirama. Emos, Punks e Góticos discutem sobre Reggae, Jazz e Samba. Mas ainda não é aqui onde eu deveria estar. Outras duas e continuo meu caminho.
No meio do caminho, uma coletividade masculina vai se espalhando pelos neons fracos das casas, em busca de entretenimento para maiores. Melhor passar direto, senão não fica só em duas cervejas, e a dor de cabeça vai ser muito pior de que a de uma ressaca qualquer.
Quando vou passando pelo Inferno, metaleiros e rockabillys vão formando uma fila em busca de diversão. Ao me empolgar com
outro grito vem na minha cabeça, bem direto por sinal. O grito de: “É aqui, totó” é um aviso. Um aviso do outro lado da rua. No Outs é dia de
Era esse o lugar que estava procurando.
Quem sabe não consigo visualizar o “underground” diurno? Porque hoje só saio amanhã! E se a ressaca deixar.
¹referência direta à música de Iggy & the Stooges
²vocalista do Bad Religion
³ 1ª. Estrofe de A WALK, (Caminhada) do Bad Religion
Eu vou para uma caminhada,
Não daquelas de após o jantar
Eu vou usar minhas mãos
E eu vou usar minha mente

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